Relações Conscientes – “Imagine all the people living life in peace!”
3 de Abril, 2023Podcast Sobre Autoestima
17 de Abril, 2023Muito falada, mas que escasseia em muitos casos, numa sociedade muito virada para o fazer, para a autoconfiança, a promoção da autoestima acaba por nos escapar entre os dedos, e não estar tão presente como seria desejável nas interações com as nossas crianças. Se pensarmos que a autoestima engloba tudo aquilo que sabemos sobre nós e a forma como nos relacionamos com isso, facilmente percebemos que quanto melhor for essa relação connosco, mais saudável e estável será a nossa autoestima. E existem práticas que potenciam este processo nas nossas crianças. Falo em crianças, mas não só. A verdade é que considero que estas práticas podem também ter um efeito reparador na interação com adultos. São elas Amor incondicional, Aceitação, Presença Consciente, Reconhecimento e Confiança na Criança.
Quando falamos em Amor incondicional tendemos a associar aos pais em relação aos filhos, como sendo os únicos capazes de amar sem condições. Existem, contudo, muitas formas de interagir nas várias relações que estabelecemos, que podem tirar a carga do “condicional”, como por exemplo, valorizar a criança (ou o adulto) pelo que ela é, e não pelo seu desempenho num dado momento ou tarefa. Desta forma, estamos a demonstrar que ela é merecedora de amor independentemente do seu comportamento. Se pelo contrário as nossas interações se pautarem pela oferta e retirada de amor, como “premiar” o “bom comportamento” com estrelinhas e retirar em caso de “mau comportamento”, estou a passar uma ideia amor condicional, que pode levar a criança a acreditar que só merece amor quando se comporta de uma determinada forma. As palmadas e os castigos têm um impacto ainda maior, por serem muitas vezes sentidos como uma forma de “desamor”, além de muitas vezes acabarem por ser uma forma de procura de obediência utilizando o medo da punição, e não de uma colaboração em que a criança sente que é tratada com igual valor. A criança não faz porque aquilo lhe fez sentido, faz para evitar uma consequência negativa.
Uma outra prática que promove a construção da autoestima é a Aceitação, que é estar em paz com a situação como ela é. Repare, não é desistência, nem resignação. A Aceitação é um processo muito mais ativo, que nos dá espaço mental para pensarmos em alternativas que não iriam surgir na nossa mente, se entrássemos em processo de luta ou de resistência. Ao sentir-se aceite, a criança cria uma ideia de si como alguém com valor. Isto é particularmente importante com crianças menores de 9 anos, uma vez que até esta idade a criança tem dificuldade em separar-se do próprio comportamento, ou seja, se critico o comportamento é como se estivesse a criticar a própria criança. Por exemplo, em vez de ouvir “aquilo que fizeste é mau” o que a criança tende a ouvir é “tu és má”.
A próxima ferramenta de que vou falar, é a que mais sinto estar em falta nos dias que correm. Refiro-me à Presença Consciente. Ela é extremamente importante para estimular o desenvolvimento da autoestima. Não é uma questão de tempo, é uma questão da qualidade do tempo, de estar realmente ali, naquele momento. Basta pensarmos na diferença que sentimos quando estamos a falar com alguém que nos olha nos olhos, demonstra atenção e interesse pelo que está a ser dito, em comparação com alguém que nos esta a ouvir enquanto está a olhar para o telemóvel. As crianças precisam sentir-se vistas, ouvidas e valorizadas.
Uma relação consciente privilegia também o Reconhecimento, e prefere utiliza-lo em vez do elogio. Um elogio tem sempre um reverso, por exemplo: “se sou um menino bonito porque comi a sopa toda, se não o fizer passo a ser um menino feio, é isso?” ou dizermos “que desenho tão bonito!”, é uma forma de avaliação. Ao praticar o Reconhecimento estou a mostrar à criança que a vejo. Na prática, consiste em descrever o que observamos e mostrar interesse sob a forma de perguntas, por exemplo: “vi que estás a fazer um desenho. Queres falar-me sobre ele?”.
Para finalizar, temos a prática de Confiança na Criança. Quando a criança sente que o adulto confia nas suas capacidades e competências, sente mais coragem e responsabilidade, o que promove o desenvolvimento da sua autoestima. Se pelo contrário sentir a preocupação dos adultos quando, por exemplo, toma a iniciativa para realizar uma determinada tarefa, como vazar água de uma garrafa para um copo, sente isto como sinal de que não confiam nela, e o potencial de desenvolvimento da autoestima diminui. É importante procurarmos não passar as nossas preocupações para a criança, uma vez que podem ser extremamente limitadoras.
Ter consciência destas práticas, mantê-las presentes nas nossas relações e interações, pode ter um forte impacto no outro, sobretudo quando falamos de crianças, que estão a construir os primeiros alicerces da relação consigo próprias. Para mim, falar em autoestima é falar no casaco que começamos a vestir na infância, que nos protege do frio para a vida toda.